Ontem à tarde, após um compromisso, estava voltando para casa. Quando o ônibus passou pelo Bom Juá, vi que havia um grupo de evangélicos fazendo pregação no meio da rua. Havia gente distribuindo panfletos aos transeuntes e dentro do carro (que mais parecia um trio elétrico, dada a quantidade, o tamanho e a potência das caixas de som). O pregador estava gritando e gesticulando (como sempre), fazendo de tudo para chamar a atenção das pessoas e, quem sabe, tentar trazer mais uma ovelha desgarrada para o rebanho do senhor. O buzu dentro do qual eu estava passou bem na hora em que o sujeito falou a seguinte frase:
“A IRA DO SENHOR PERMANECERÁ SOBRE AQUELES QUE REJEITAM A SALVAÇÃO”
Ao ouvir isso, pensei: para tudo! São essas as pessoas que vivem repetindo o tempo todo que deus é bom, amoroso, compassivo e misericordioso, cheio de bons sentimentos e incapaz de guardar mágoas e rancores? Então, por que deus fica irado com as pessoas que não querem ser salvas? Esses fanáticos falam a todo instante que a Bíblia diz que deus deu o livre-arbítrio para que a humanidade possa fazer as suas escolhas. Todavia, por que deus se torna implacável contra os seres humanos que tomam decisões que não condizem com os interesses dele? Se deus é tão compreensivo quanto dizem, eu acho que ele tem que aceitar qualquer decisão tomada pelos humanos (livre-arbítrio é isso – pelo menos para mim). Se ele me dotou da capacidade de decidir, eu vou tomar a decisão que eu bem entender. Se eu quiser fumar maconha, beber, estudar Direito, virar bandido, estudar física quântica, me prostituir, escalar um prédio sem equipamento de segurança ou seja lá o que mais, deus não tem nada a ver com isso. Ele deu o poder do discernimento a mim e, agora, não quer aceitar o caminho que EU escolhi para a minha vida? Só lamento. Agora, aguente!
O mais irônico disso tudo é que são essas mesmíssimas pessoas, que acreditam nesse deus vingativo, perseguidor, cruel e autoritário, que saem às ruas para distribuir folhetinho, fazer pregação nos ônibus, dizer que deus é amor (!), que jesus tem um plano na minha vida, e que para isso eu tenho de entrar em determinada igreja para receber as bênçãos dos céus e ser agraciado com a salvação. Já tive um colega de escola que só faltou colocar uma arma na minha cabeça e me obrigar a ir à igreja porque ELE achava que eu tinha de ser salvo de qualquer jeito, pois jesus havia mudado a vida dele e queria mudar a minha também – por mais que eu não quisesse isso. A minha sorte foi que o ônibus apareceu logo, e, em virtude da situação, eu pulei dentro e larguei o babaca lá falando sozinho. Nunca mais vi o desgraçado depois daquele dia (ainda bem!).
Tô fora! Cultuar um deus que ficará o tempo todo se metendo na minha vida, vigiando as minhas ações, interferindo nas minhas vontades mais subjetivas, dizendo o que eu devo ou não devo fazer e que não hesitará em acabar comigo se por acaso eu, em algum momento, não fizer o que ele quer? Nem morto! Quem vai é coelho!!!
(Se deus é capaz de fazer isso tudo porque me ama, eu nem quero imaginar o que ele faria caso me odiasse.)